quinta-feira, 14 de maio de 2009

Deliberação do CNCS sobre a queixa da Associação Baixa de Cassange contra o Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola

DELIBERAÇÃO

A – FACTOS

1- O Conselho Nacional de Comunicação Social, recebeu aos 03 de Abril de 2009, uma queixa da Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, com a data de 27 de Março de 2009, assinada pelo senhor José Lando Fufuta, seu presidente.

Na queixa a aludida organização alega a existência de “fechamento deliberado” por parte dos órgãos de Comunicação Social públicos, em particular o Jornal de Angola e a Rádio Nacional, aos líderes da sociedade civil que criticam as acções negativas do Governo Central e provinciais.

A Associação da Baixa de Cassange enfatiza na queixa que o seu líder José Lundo Fufuta estaria impedido de conceder entrevistas ao Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola há quatro anos.

2- Respeitando o princípio do contraditório, relevante em direito e sobretudo ao direito processual, o Conselho Nacional de Comunicação Social notificou os directores gerais dos órgãos de comunicação acima citados, para, no prazo de oito dias responderem a queixa apresentada pela Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, nos termos da alínea b) do n.º. 7 do artigo 17º. do Regimento do CNCS.

O Director do Jornal de Angola respondeu no dia 15 de Abril e o Director da Rádio Nacional de Angola no dia 23, muito embora o respectivo documento tenha chegado a nós apenas no dia 30, já que o mesmo teria sido erradamente entregue ao Ministério da Comunicação Social.

3- O Jornal de Angola respondeu:

a) “Não temos registo de qualquer recusa do Jornal de Angola em publicar informações, incluindo entrevistas ao Sr. José Lundo Fufuta, ligado a Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, queixa que muito estranhamos”.


A Rádio Nacional de Angola alegou o seguinte:

a) Que em nenhum momento impediu o Sr. José Lundo Fufuta de falar a Rádio Nacional de Angola e não tem registo de algum pedido nesse sentido.

b) A Rádio Nacional tem dado cobertura de destaque às manifestações alusivas ao Massacre da Baixa de Cassange e a todos os intervenientes directa ou indirectamente ligados a efeméride.

c) Que a queixa visa denegrir a imagem da Rádio Nacional de Angola.


B – ANÁLISE

1- O Conselho Nacional de Comunicação Social declara-se competente para analisar a queixa da Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange nos termos das alíneas a), b) e d) do artigo 3º da Lei 7/92, de 16 de Abril.

2- Sem entrarmos exactamente no mérito da queixa, afigura-se importante referir que à luz das obrigações legais que impendem sobre os meios de comunicação social públicos, constitui conduta reprovável o alegado “fechamento deliberado” como aponta a Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, ao comportamento da midia estatal.

Saliente-se que todos os órgãos de comunicação social têm a responsabilidade social de “informar o público com verdade, independência, objectividade e isenção, sobre todos os acontecimentos nacionais e internacionais, assegurando o direito dos cidadãos à informação correcta e imparcial”, (alínea b) do artigo 11º da Lei n. 7/06, de 15 de Maio). O mesmo artigo na sua alínea c) refere ainda que a imprensa deve “assegurar a livre expressão da opinião pública e da sociedade civil”.

3-Ora, da análise dos factos e dos demais elementos que constituem este processo, extrai-se que a Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange, não assentou a sua queixa em prova bastante. O simples facto de alegar que o seu líder está impedido de conceder entrevistas ao Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola há 4 anos não se afigura como prova suficiente para qualquer tipo de juízo de valor. Não existem solicitações escritas de coberturas de actividades daquela associação nem convocatórias assinadas pelo seu líder.

4- O Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola negam qualquer bloqueio informativo contra a queixosa. Do lado da imprensa está, de resto, o facto de não existirem documentos que sustentem o alegado impedimento do líder da Associação conceder entrevistas a estes dois órgãos de comunicação social.



C – CONCLUSÃO/RECOMENDAÇÃO

1- Apreciada uma queixa da Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange contra o Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola por alegado impedimento do seu líder, José Lundo Fufuta, de conceder entrevistas a estes dois órgãos de comunicação social públicos, o Conselho Nacional de Comunicação Social com base nos elementos de facto e de direito trazidos ao processo delibera:

a) Considerar improcedente a queixa da Associação de Apoio para o Desenvolvimento da Baixa de Cassange contra o Jornal de Angola e a Rádio Nacional de Angola por ausência de prova bastante.

b) Recomendar aos órgãos de comunicação social que tenham em devida conta à luz das obrigações legais o dever de ouvir todas as sensibilidades e sectores da nossa sociedade sempre que em causa estiver a salvaguarda do interesse público.

Esta deliberação foi aprovada em sessão plenária extraordinária do Conselho Nacional de Comunicação Social, que contou com a presença dos Conselheiros:


Francisco Alexandre Cristóvão da Silva – Relator

António Correia de Azevedo – Presidente
Manuel Teixeira Correia – Vice-Presidente

Lucas Manuel João Quilundo

David João Manuel Nkosi

Mbuta Manuel Eduardo

Joaquim Paulo da Conceição

Armando Garcia Benguela

Mfuca Fuacaca Muzemba

António Pedro Cangombe

Oliveira Epalanga Ngolo

Armando Chicuta Calumbi

Reginaldo Telmo Augusto da Silva

Rosalina da Rocha António Mateta

Lucília Palma Gouveia


CONSELHO NACIONAL DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, em Luanda, aos 08 de Maio de 2009. -


O PRESIDENTE,

António Correia de Azevedo.

Deliberação do CNCS sobre a queixa apresentada pela PGR contra o semanário Folha-8

DELIBERAÇÃO

A – FACTOS

1-No dia 14 de Abril do corrente ano, deu entrada no Conselho Nacional
de Comunicação Social (CNCS) uma queixa da Procuradoria Geral da República, assinada pelo seu Vice-Procurador, Senhor Henrique dos Santos, contra o bissemanário “F8” do seguinte teor:

“Sob o título “Política”, publicou o Bissemanário “Folha 8, no dia 04 de Abril de 2009, páginas 16 e 17, um artigo que se nos afigura conter não só matéria que constitui crime de abuso de liberdade de imprensa, quiçá, contra a segurança de estado, como também lesante da conduta e deontologia profissionais a que os jornalistas estão vinculados.

Na verdade, as afirmações e comentários ilustrados com imagens de corpos humanos esfacelados, chocantes, arrepiantes e horrorizantes, intencional e propositadamente escolhidas, em nada contribuem para a mudança das mentalidades pacificação dos espíritos e harmonização da sociedade angolana, pelo que os seus actores devem ser repreendidos e sancionados nos termos da Lei.

A Procuradoria-Geral da República instaurou já processo crime, como consta do documento em anexo e submete a questão a esse Conselho, para o que for julgado conveniente”.

1-
De acordo com o Regimento do CNCS o “Folha 8” foi notificado para, querendo, responder a matéria objecto da queixa.

2- Em resposta, subscrita pelo seu Director, Senhor William Tonet e recebida no CNCS em 24 de Abril, o “Folha 8”, afirma textualmente:

“Recebi, uma vez mais, com bastante estupefacção, vossa nota S/N do 14 de Abril de 2009, mas só recepcionada nos nossos escritórios, como sempre, dois dias depois; 16.04.09, dando conta de uma queixa-crime contra o bissemanário Folha 8, seu director e um jornalista da parte da Procuradoria Geral da República.
A nossa indignação funde-se no facto de não saber quais os limites e o papel do CNCS, em relação a certos órgãos de imprensa, porquanto a forma titubeante, como se interpreta o caput do art.º 8 da Lei de Imprensa deixa muitas dúvidas, quanto ao ser “
um órgão independente que tem por missão assegurar a objectividade e a isenção da informação e a salvaguarda da liberdade de expressão e de pensamento na imprensa, de harmonia com os direitos consagrados na constituição e na lei”. Diante deste articulado, não é de bom tom a parcialidade do CNCS, ao apor a sua chancela na acusação da PGR, quando textualiza: pela representação da violência nos meios de comunicação social”. É o esplendor da vossa reiterada parcialidade e o amarfanhar do princípio da “presunção de inocência até decisão judicial transitada em julgado”.
Comentários? Para quê?...
Os artigos 36º, 32º e 35º, todos da Lei Constitucional, enquadram o exercício vertido no artigo publicado no F8 e alvo da queixa da PGR, que esperávamos contar não com a vossa solidariedade, mas ao menos concelhia, a um órgão de imprensa. Adiante.
A questio suscitada, enseja polémica no que se refere aos limites e características do princípio da liberdade de imprensa e de expresso e da interpretação quanto a alegados
“abusos” e quebra de respeito devido aos mortos”
, como sustenta a PGR, numa clara insignificância que é, entre nós, causa supra-legal de atipia penal, pela prática reiterada cometida por órgãos públicos, sem que tal repulsa tenha alguma vez manifestado, no seio do CNCS e da PGR.
Ademais não é verdade que o Conselho seja “
competente para conhecer da presente queixa”.
Diz a doutrina que havendo uma situação de litispendência, isso é, um processo crime a decorrer sobre a mesma matéria, deve este Conselho aguardar a decisão a ser proferida pelos tribunais para depois poder tomar um posicionamento.
Isto significa que qualquer decisão a ser tomada neste Conselho poderá ser aproveitada de forma positiva e negativa pelas partes. Seguramente o F8, não pode incorrer na ingenuidade de debitar argumentos, nesta instancia, para estes escorregarem imediatamente para quem lhe quer colocar a cabeça na guilhotina. Finalmente gostaríamos de solicitar a este Conselho Nacional de Comunicação Social, no pedestal da sua competência, um olhar imparcial sobre a utilização reiterada, nos meios de comunicação social públicos dos membros da Oposição mortos de 1992 a 2002, para este servir de suporte a nossa defesa, na barra.
“Isto porque o princípio em tela, tal como, também, qualquer dispositivo legal, deve ter necessariamente um significado, um sentido. Não pode ensejar absurdos axiológicos e nem estabelecer contraste com texto expresso não contestado (comparativamente, sobre o princípio estruturado por Roxin, Tiedemann e outros, tem-se, em doutrina: “O Princípio da Insignificância como excludente da tipicidade no Direito Penal”, de Carlos Viço Manas, “O Princípio d Insignificância no Direito Penal”, de Maurício António Ribeiro Lopes, RT e “Observações sobre o Principio da Insignificância”, de Odone Sanguiné, nos “Fascículos das Ciências Penais”, Safe, vol. 3, n.º 1)”.
Na autoctónia da discriminação e da modéstia, a que estamos votados, é tudo quanto nos cumpre informar”.

B – ANÁLISE

1- O Conselho Nacional de Comunicação Social declara-se competente para conhecer da presente queixa com base nas alíneas b) e e) do artigo 3º da Lei n.º 7/92, de 16 de Abril.

2- Antes de entrar na análise concreta da queixa e à guisa de resposta às questões suscitadas pelo “F8” importa referir que:
Ao contrário do que parece pretender-se, não compete ao CNCS, no quadro das suas atribuições e competências, opinar “sobre a utilização reiterada, nos meios de comunicação social públicos dos membros da oposição mortos de 1992 a 2002”.

O CNCS não se permite fazer mais do que a lei lhe autoriza ainda que se imagine neste organismo poderes que não tem.

Quanto à eventual litispendência, mesmo aceitando que as disposições do Código de Processo Civil sobre esta questão, se aplicam supletivamente aos processos da competência do CNCS, tal não poderá, nesta sede, ser analisada por manifesta ausência de repetição de uma causa, de acordo com os conceitos e requisitos da litispendência expressos nos artigos 497º e 498º do referido Código.

No mais, lembra-se que o CNCS não se ocupa da intencionalidade do acto de informar mas do modo como se reveste a sua materialização, no respeito pelo quadro ético-normativo dentro do qual a informação rigorosa se desenvolve e atinge expressão pública. É da exclusiva responsabilidade dos Tribunais o julgamento de comportamentos que lesem valores e interesses jurídicos penalmente protegidos que se consumam pela publicação de textos ou imagens através da imprensa.

Por isso, andou bem a PGR instaurando processo-crime por abuso de liberdade de imprensa contra William Tonet e Arlindo Santana, autores do texto publicado e apresentando queixa ao CNCS contra o bissemanário “Folha 8” por violação de normas ético-legais aplicáveis aos órgãos de comunicação social.

3- Atentamente analisada a peça jornalística como um todo que é, fica-se
desde logo com a ideia clara e objectiva de que a mesma não reflecte o propósito de fornecer aos leitores um trabalho de inegável interesse público. Ademais, não foi elaborada com a preocupação de rigor e isenção essenciais ao acto de informar.

4- O CNCS defende a ideia de que os jornalistas no exercício livre e
democrático do seu direito à liberdade de expressão devem sim mostrar nos seus órgãos de comunicação a violência, enquanto representação da realidade, sempre que a sua difusão se revelar significativa e essencial para a protecção dos interesses públicos e para a defesa das liberdades civis.

Mas, rejeita não só a exploração da crueldade ou do carácter mórbido das situações como também os programas, textos ou imagens que ferem sentimentos e incitem a violência que até podem descambar em situações extremas de consequências imprevisíveis.

5- Em Angola a violência física e psicológica, directa e indirecta atingiu dramática e angustiantemente toda a nação em consequência da guerra colonial e do conflito armado que se lhe seguiu. Os resquícios deste fenómeno são mais do que evidentes no quotidiano da nossa sociedade.

6- O “F8” ao mostrar nas sua páginas com direito a distinção de capa, com algum prazer sádico e sem qualquer pudor, fotografias de um acto violento que teve como consequência a morte do Presidente da Guiné-Bissau, Nino Vieira, interferiu notoriamente na esfera da privacidade do individuo, já que todos temos o direito à nossa privacidade incluindo na morte.

Parece, pois, legitimo, exigir que a violência só seja mostrada quando traga informação e se enquadre num contexto adequado à limitação dos seus malefícios.

Ter o jornalista bom senso e formação profissional cuidada, saber relacionar o material a publicar e proceder com moderação e contenção na sua elaboração é essencial para maximizar o esclarecimento da opinião pública de acordo com os valores da isenção e do rigor final da informação.


C – CONCLUSÃO/RECOMENDAÇÃO

1- Apreciada a queixa da Procuradoria-Geral da República contra o bissemanário “Folha 8” pelos motivos atrás suficientemente aduzidos, o Conselho Nacional de Comunicação Social (CNCS), delibera considera-la procedente por entender que:

a) o material jornalístico publicado pelo “Folha 8”, não reflecte o propósito de fornecer aos leitores um trabalho de inegável interesse público;
b) o trabalho jornalístico mostrado pelo “Folha 8”, não teve em conta as exigências decorrentes do respeito pela reserva da imagem e intimidade da vida privada dos cidadãos;

2- Nestes termos, o CNCS recomenda ao bissemanário “Folha 8” o escrupuloso cumprimento da Lei de Imprensa, designadamente, quanto à observância da isenção, rigor e objectividade, como elementos indissociáveis do direito de informar.

Esta deliberação foi aprovada em sessão plenária extraordinária do Conselho Nacional de Comunicação Social, que contou com a presença dos Conselheiros:

Maria Lucília de Jesus Leite Faria – Relator

António Correia de Azevedo – Presidente
Manuel Teixeira Correia – Vice-Presidente

Lucas Manuel João Quilundo

David João Manuel Nkosi

Mbuta Manuel Eduardo

Joaquim Paulo da Conceição

Armando Garcia Benguela

Mfuca Fuacaca Muzemba

António Pedro Cangombe

Oliveira Epalanga Ngolo

Armando Chicuta Calumbi

Reginaldo Telmo Augusto da Silva

Rosalina da Rocha António Mateta

Lucília Palma Gouveia


CONSELHO NACIONAL DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, em Luanda, aos 08 de Maio de 2009. -

O PRESIDENTE,

António Correia de Azevedo.